sábado, 22 de agosto de 2015

Sobre simplificar

Não me vejo te amando.
Não te amei. Não te amo. Nunca te amarei.
Mesmo assim, pensando em você agora me deu muita vontade de te ver.

Soa louco, né?
Principalmente se a gente for considerar que eu recusei todos os seus últimos convites.
Honestamente, eu cogitei não te ver nunca mais.
Até porque, a gente não tem nada a ver.

As nossas conversas eram entediantes, eu odiava ouvir sobre as suas ex-namoradas, ou sobre o seu pai te dando esporro por mais um arranhão no carro, ou sobre a sua faculdade que você ama odiar.

E eu sei que tudo o que eu falei pra você sobre o último livro que eu li te deu sono, aliás, tudo o que eu dizia te dava sono.
Eu sempre achei uma falta de educação tremenda o fato de você nem ao menos tentar tampar a boca ao bocejar enquanto eu discursava apaixonadamente sobre coisas que você fingia escutar.
"Finge que presta atenção direito, porra!" - era o que eu queria te falar.

Não acho que essa ânsia por te reencontrar seja carência.
Até porque, existem opções mais próximas à minha localização, e que dialogam melhor que uma porta, que, no caso, dialoga melhor que você.
E eles não são de se jogar fora.

Mas o seu sorriso é maravilhoso e sobre o seu beijo, eu nem preciso comentar.
E apesar disso nunca ter me bastado, e da minha plena consciência de que isso não me basta nem nunca me bastará, hoje eu pensei em você o dia inteiro.
Engraçado isso, porque eu não me lembro do que você falava, ou do que te fazia rir, mas eu me lembro direitinho do som da sua voz, do som da sua gargalhada...

Então a gente pode fazer assim:
Me encontra amanhã, no mesmo lugar de sempre.
Quando a gente estiver andando, não precisa me dar a mão, eu odeio a sua mão suada.
Também não precisa limpar o carro, já te disse que eu cago pra isso.
Não precisa nem dizer que eu tô linda.
Mentira, diz sim, eu devolvo o elogio sorrindo e você retribui com aquele seu sorriso lindo.
Me encontra lá, tá?

Beijo e até amanhã.


quarta-feira, 12 de agosto de 2015

É preciso desprecisar




Sempre odiei tudo o que escrevi.
Se não achava estúpido ou pobre ou exagerado ou insuficiente, achava fingido.. 

Foi aí que Manoel de Barros entrou na minha vida.
Me fez ver o quão pragmática e quadrada eu sou.
Me fez ver como eu estava equivocada ao tentar engaiolar as palavras a fim de fazê-las cantarem só para o meu bel prazer.
Não é preciso muito esforço para entender o porquê de conseguir tirar delas somente canções desesperadas.
Nas palavras eu conseguia ver somente uma vontade louca delas de fugirem de mim.

Observei a forma como Manoel deixava as palavras voarem livremente.
Com ele, as palavras ilimitam-se.
A poesia de Manoel de Barros não é gaiola.
A poesia dele é árvore. 
E as palavras pousam na árvore de forma tão natural quanto bela.
Livro sobre Nada é o livro sobre o desimportante.
Manual sobre como desprecisar.

Escrita boa não é pretensiosa.
Porque a pretensão pesa nas palavras.
E palavras pretensiosas pesam nos galhos das árvores.
Palavras-passáros transformam-se em extensões da árvore, mas se estiverem pesadas, se quebram os galhos, não são extensões, são diminuições.
E a alma depois do poema quer se expandir, não quer?
Nem que seja expandir pro vazio. E vazio não é diminuição, entendam. Melhor, sintam:

O menino que carregava água na peneira (Manoel de Barros)


Tenho um livro sobre águas e meninos.
Gostei mais de um menino que carregava água na peneira.
A mãe disse que carregar água na peneira era o mesmo que roubar um vento
e sair correndo com ele para mostrar aos irmãos.
A mãe disse que era o mesmo que catar espinhos na água
O mesmo que criar peixes no bolso.


O menino era ligado em despropósitos.
Quis montar os alicerces de uma casa sobre orvalhos.

A mãe reparou que o menino gostava mais do vazio do que do cheio.
Falava que os vazios são maiores e até infinitos.
Com o tempo aquele menino que era cismado e esquisito
porque gostava de carregar água na peneira
Com o tempo descobriu que escrever seria o mesmo
que carregar água na peneira.
No escrever o menino viu que era capaz de ser
noviça, monge ou mendigo ao mesmo tempo.
O menino aprendeu a usar as palavras.
Viu que podia fazer peraltagens com as palavras.
E começou a fazer peraltagens.

Foi capaz de interromper o vôo de um pássaro botando ponto final na frase.
Foi capaz de modificar a tarde botando uma chuva nela.
O menino fazia prodígios.
Até fez uma pedra dar flor!

A mãe reparava o menino com ternura.
A mãe falou: Meu filho você vai ser poeta.
Você vai carregar água na peneira a vida toda.
Você vai encher os vazios com as suas peraltagens
e algumas pessoas vão te amar por seus despropósitos



segunda-feira, 3 de agosto de 2015

Sobre caminhos e pessoas



Até ontem eu tava louca!
Queria responder aquela mensagem de três dias atrás dizendo que eu menti, que eu não tô legal.
Mas não tive tempo pra isso.
Tantas coisas acontecendo, e tantas outras que eu tenho feito acontecer.

Lógico que de vez em quando eu parei e pensei em você.
Juro que eu pensei que a melancolia ia tomar conta, e ela até que tentou.
Bateu na porta e eu até cogitei abrir pra gente tomar um café, um chá, um vinho, quem sabe.
Mas o sol nem pediu licença, invadiu pela janela, iluminou, aqueceu e não me deixou só em momento nenhum, a melancolia pegou carona e adentrou o lar, mas se escondeu nas sombras, que obviamente, toda luz projeta em ambientes não-vazios. Manteve-se ali, escondida, observando o brilho do sol e entendeu que estava ali somente para equilibrar.

Não, eu não estou a jogar o jogo do contente.
Admiro a Pollyanna, mas depois de uns tombos feios e outros nem tanto, aprendi que algumas dores a gente deve tentar aliviar, e outras a gente deve sentir, mas nunca inventar dor onde não há.

Não dói.
Eu ainda tô no ar, ainda não caí, e se bobear nem vou.
E se eu entender o mecanismo da queda à tempo? E se eu parar com os dois pés no chão e sem nenhum arranhão?

Eu acho que relacionamentos dolorosos e sofridos são superestimados.
Eu acho que relacionamentos deveriam focar pura e simplesmente no relacionar.

A gente tá andando, não necessariamente na mesma direção, não necessariamente em direções opostas, não necessariamente um de encontro ao ou outro estamos apenas andando.
De vez em quando a gente se esbarra por aí, da mesma forma que esbarra em tantas outras pessoas diariamente.

E você é uma pessoa!
Não é só mais uma pessoa, jamais será.
Mas você não é caminho. Você é uma pessoa.
Se fosse caminho, eu logicamente ficaria perdida se você sumisse do meu campo de visão.

Mas você é pessoa!
Daquelas que eu quero dar um abraço apertado quando vejo, daquelas que eu me lembro enquanto caminho e que às vezes caminham do meu lado, daquelas que mesmo sem que eu veja eu sei que não vão sumir nunca, daquelas que me fazem saudosa quando não estão aqui, daquelas que durante o caminho todo eu torço para encontrar e reencontrar.

Um caminho é necessário.
Sem um caminho ninguém é nada.
Pessoas não são necessárias.
Pessoas não estão na nossa vida por necessidade.
Estão porque a gente quer que elas estejam.
Estão porque querem estar.

Você não é caminho.
Você é pessoa.